França, Croácia, feijão e arroz

por Fernando Jasper

Esquema tático revolucionário? Não.

83% de posse de bola e 94% de precisão no passe? Não.

Esquadrão que encantou, ou amedrontou, o mundo? Também não.

Depois de duas Copas vencidas por times badaladíssimos, que para o bem ou para o mal pareciam estar reinventando o jogo, teremos neste domingo uma final de feijão com arroz.

(O que significa, antes de mais nada, que pelos próximos quatro anos seremos poupados de aporrinhação sobre a “nova ordem” do futebol mundial e bobagens assim. Eu espero.)

De um lado, um time com gente boa em todos os setores do campo e que, no geral, vem justificando a fama. A França faz o básico, e faz bem, porque tem material humano para isso. Porque seu treinador não tenta se fazer de gênio e porque esse material não decepcionou, ao contrário da maioria de outros bambambãs do Mundial, que não perderei tempo citando.

Para o espectador desinteressado, a França só divertiu quando jogou seu melhor e pior ao mesmo tempo, na vitória por 4 a 3 sobre a Argentina. Mas, sejamos justos, ninguém está ali para entreter. Depois de uma primeira fase protocolar– que encerrou com o único 0 a 0 da Copa, uma coisa lamentável contra a Dinamarca – e daquele sábado emocionante contra os argentinos, a França que passou por Uruguai e Bélgica foi um time sólido, que mal tomou sustos e fez o que precisava sem muita contestação.

É favorita. Mas também era contra Portugal na Eurocopa que perdeu em casa há dois anos. E seu adversário neste domingo é melhor que o daquela vez.

A Croácia é a zebra. Mas não é “o time desacreditado que surpreendeu a todos e chegou à final”. Mostrou o cartão de visitas no amistoso que perdeu para o Brasil dias antes da Copa e foi elogiada antes da estreia por gente que respeito. Conheço dois caras que, ao fim da primeira fase (e que fase!), já apostavam que ela chegaria à final.

É claro que, para ir tão longe, ela se beneficiou do fato de cair na chave mais fácil do mata-mata. Mas quem hoje ousaria dizer que os croatas tiveram moleza?

Tenho minhas reservas quanto às preferências políticas que alguns jogadores fazem questão de exibir. As repúblicas que surgiram da finada Iugoslávia, sabemos, são uma fonte abundante de controvérsias. E nem Modric, que como tantos colegas carrega uma história de provações e superações da época da guerra, está livre de histórias mal contadas.

Mas, futebol pelo futebol, é um presente ver na final um time que passou por três prorrogações e duas disputas de pênaltis. Na prática, os croatas jogaram uma partida a mais que os franceses – e pergunte se alguém pediu arrego.

Uma equipe que representa um país de 4 milhões de habitantes, uma espécie de Uruguai da Europa, com estrutura precária para o futebol, nas palavras do próprio treinador. Treinador este que, chamado às pressas e sem contrato, conheceu seus atletas no aeroporto, a caminho da última rodada das eliminatórias – eles então derrotaram a Ucrânia e conseguiram vaga na repescagem, quando eliminaram a Grécia.

É o triunfo do caos e da persistência. Mas não só isso. Embora não tenha o tempero do cassoulet francês, a Croácia também joga bola. Simples, sem recorrer à violência nem à retranca.

Será divertido. Eu espero.

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