A última rodada é onde nascem os fortes

Por Túlio Pires Bragança

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Na novela das 11 da noite da toda poderosa Globo, Onde Nascem os fortes, Patricia Pilar come o pão que o diabo amassou para descobrir o paradeiro de seu filho. Fábio Assunção, Alexandre Nero e grande elenco estão juntos atuando para deixar a vida de Pillar a mais bosta possível. É uma desgraça atrás da outra.

É mais ou menos assim que muitos times grandes se sentiram na última rodada da primeira fase desse torneio de futebol que é uma verdadeira benção de Deus: A Copa do Mundo. Quando eles acham que está tudo tranquilo, aparece um Fábio Assunção na vida deles. Quando parece que não existe desgraça maior que um Alexandre Nero, um coronelzão do sertão, vem pra mostrar que sempre na vida a gente pode estar ainda pior. O roteirista do futebol encarnou de vez o Tarantino e não para de colocar reviravolta nessa trama futeboleira.

A toda poderosa Alemanha achou que tudo estava no papo. Afinal só precisava de um golzinho contra a já eliminada Coreia do Sul. Espanha contra Marrocos a mesma coisa, mas foi um empate bastante suado contra um time que todos esperavam já não ter nenhuma alegria em jogar.

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Isso se repetiu em Japão contra a já desqualificada Polônia, que passou graças ao suor dos colombianos. Suiça que pegou uma Costa Rica que parecia renascida das trevas e empatou heroicamente.

Que motivação é essa que faz com que esses times que não tem mais razão para lutar vençam, ou pelo menos dificultem, as equipes que tem tudo para seguir no torneio? Será que a honra e o medo de se tornar uma piada internacional são maiores que a fome de passar de fase? O que é mais motivador para uma seleção na copa ganhar?

Da onde um coreano abatido e envergonhado por já estar fora da Copa consegue tirar força para ganhar de uma Alemanha?

Deixo essas perguntas para o ótimo roteirista desse torneio. Não tem filme cult iraniano, pornochanchada brasileira, blockbuster americano,  ou drama argentino melhor do que a COPA!

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Levantado do chão

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♫♪ Get up, get up, get up / Turn me on and let me do my thang ♫♪

A gente sempre tenta chicotear uns textos aqui e ali e fazer eles confessarem alguma graça e, desse modo, gerar qualquer coisa de lírica ou de épica pro futebol, essa coisa tão chã, tão feita de grama sintética do futebol society com os CHAMPZ ou do CHÃO-ELE-MESMO dos campinhos de terra batida.

(Entre os açoites que falei lá, tá a digressão que lançarei ali ó)

Aliás, quantos desses peladeiros-mirins aí não serão a SALVAÇÃO DA LAVOURA lá no Catar pra seleção do canário brabão? Quantos desses moleques não saem BEM LOKO do jogo do Brasil pra gritar lá no poeirão que é Coutinho, Jesus, Paulinho e, claro, Neymar.

Pois Neymar Jotaerre sempre chamou a paixão dos torcedores com suas firulas com a bola (sobretudo quando o seu time vence), os golaços e a tal aura de craque. Mas calhou de este ano caírem no couro dele justamente por estar mais na horizontal que vertical (mais sobre esse haterismo neymariano aqui). Isso depois da já bem consolidada a mitologia CBFista do Deitador Fred, que faz gol de comprido e muito mais — e aproveita pra aumentar seus créditos de COMEDOR ™.

Bem, que o Neymar é kaikai é coisa sabida mais ou  menos desde de o seu começo carreira lá por 2009 e não enveredo por essa (boa) discussão de por-que-tanta-raiva-meu-deus. Aos fatos: nas 3 partidas até aqui, a seleção jogou com 3 times de boa defesa que sabem que podem irritar o Brasil e que irritaram o Brasil.

Nos dois primeiros jogos, a reação de Neymar (e falo dele, pois além da estatística de mais FALTADO em campo, também é o que produzia as mais belas e empolgantes cambalhotas e rolagens pós contato), foi de forçar: a qualquer contato de adversário, o camisa 10 BR fazia o raio e corria pra terra.

PORÉM, na peleja de hoje, contra a Sérvia, a postura foi outra: não olhou pro árbitro lânguido por faltas, não socou a bola descontente, não implorou que a pelota fosse ao tablado e a partida reiniciasse. Aguentou o que pode e só caiu quando o equilíbrio mandou lembranças (fora um ou dois atos FRACOS em que deu aquela encenada).

Também não LAMBEU a bola e a PRIVATIZOU para sua megacorp; não: tocou rápido, buscou espaços, triangulou. Parecia um jogador de enorme talento em um time. Não foi um jogo esplendoroso, mas foi tipo um kahani, quando um conceito faz sentido: o futebol que se luta por seguir e não por cair.

Sincerão? Nunca esperei nada do NJR, além de umas passadas de pé na bola e carretilhas quando o jogo estivesse decidido, mas hoje eu tive o vislumbre ou, talvez, me contradizendo na mesma frase, a esperança de um jogador épico, que em vez de se agarrar às gramas com as mãos, opta por se elevar e jogar no panteão do esporte.

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‘Schadenfreude’, pragmatismo e alguns desaparecimentos

Por André de Leones.

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Ao contrário do que um vizinho berrou (com a boca cheia de amendoim) agora há pouco, a melhor notícia do dia não é a desclassificação da Alemanha, mas a relativa melhora verificada na seleção brasileira em sua vitória (por 2×0) sobre a Sérvia. Em resumo, não houve chiliques, surtos e aquele nervosismo de ecos dunganescos, muito além do normal. Uma vitória (vá lá) pragmática, o tipo de coisa em geral (e ironicamente) associada à Alemanha.

Acho que a Sérvia, acaso tivesse mais habilidade para finalizar o que seu bom meio-campo e os laterais colocavam em movimento, teria obtido alguma coisa desse jogo. Não afirmo que teriam vencido, mas, em meados do segundo tempo, com o placar estacionado em 1×0, alugaram a meiuca a um preço módico, passaram a rondar a área sem que ninguém os perturbasse para valer e criaram chances que, se melhor aproveitadas, teriam engasgado aquele vizinho — talvez fatalmente.

Há muitas coisas que não compreendo nessa seleção, talvez por me faltar a sofisticação de Adenor ou a pachequice ensurdecedora do meu vizinho. A ocupação desinteligente dos espaços naquele miolo de partida seria fatal contra uma equipe, digamos, mais precisa e cuidadosa. E houve aquele momento no qual Mitrović (1,89) subiu sozinho e cabeceou a bola (por sorte) para os braços de Alisson. Quem o “acompanhava”? Fagner e seus 1,68.

Outra coisa que não compreendo é Adenor reiterando o que tem de pior: essa noção deslocada e meio enviesada de “lealdade”. Há atletas que seguem atuando muito abaixo da média, e a razão pela qual Adenor insiste em escalá-los é algo que me escapa. Ou desaparecem, ou aparecem em péssima forma, num caso e noutro contribuindo para a falta de equilíbrio da equipe. Willian e Gabriel Jesus tiveram jornadas que os colocariam no banco em seus respectivos clubes; o primeiro consagrou Casemiro (bem-vindo de volta!), que se esmerou em consertar as péssimas escolhas e os erros infantis do companheiro (aquele desarme de Kolarov, valha-me!); o segundo, ainda mais se levarmos em conta as qualidades de seu ridente substituto (mobilidade e inteligência), conseguiu a façanha de se anular e, em alguns lances, anular os colegas (sua “travada” com Neymar, ali na entrada da grande área, foi exemplarmente amadora). Se Firmino é mestre em abrir espaços, Jesus, até aqui, só tem conseguido fechá-los, facilitando a marcação adversária e tornando a vida de Willian (para não falar em Neymar) ainda mais complicada.

Enfrentar o México nas oitavas poderá ser o que Marco Antônio, pouco antes da Batalha de Actium, chamou de “teste pra cardíaco”. Osório não se acovarda. Seu time não se acovarda. Também a eles falta aquele esmero no momento da finalização ou do último passe. Mas a imposição de — ou a mera tentativa de impôr — um estilo assim agressivo é o tipo de coisa que talvez incomode mais do que a cadência e a fisicalidade de sérvios, suecos e afins. Pode ser que, contra os brasileiros, a agressividade mexicana se revele suicida. Não seria nenhuma surpresa. Mas, por outro lado, seria bom ver como os rapazes de Adenor reagiriam caso se vissem em desvantagem no placar. Seria um ótimo teste, da espécie que separa os chiliquentos dos campeões. (E um teste assim nunca vem cedo demais: melhor nas oitavas que nas semis, por exemplo.)

Mais cedo, a Alemanha ofereceu aos brasileiros o bom e velho gostinho de Schadenfreude ao cair, com deselegância inusual (ou usual nesta Copa), diante da Coreia do Sul. Joachim Löw, que seguirá comendo ranho diante das câmeras até 2022, cometeu a insânia de recolocar Özil no time titular. O que será que ele pretendia? Óbvio que Özil não foi o único responsável pela desclassificação, e as decisões inexplicáveis de Joachim já foram devassadas por este site em outras oportunidades. Mas, entre um gole e outro de Franziskaner, gostaria de reiterar uma dessas pardalices: imagina o Sané no jogo de hoje. Só imagina.

E, para terminar, ontem a Argentina fez o que se esperava dela: primeiro tentou matar Maradona do coração, depois deu um jeito de se classificar às oitavas. Com um golaço de Rojo. No finalzinho do jogo. Rojo, golaço. Não há o que não haja nessa Copa. Sigamos.

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Ele se move

Por André de Leones.

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Ele está sentado na beira da cama. Olha para o chão, depois para os pés descalços. Como se pertencessem a outra pessoa. Ainda não acordou direito. Esfrega o rosto, boceja. A porta do banheiro entreaberta. Alguma luz. Masche queria conversar antes do café-da-manhã. Repassar alguma coisa sobre o jogo. Algo sobre Ángel. Ora, Ángel que se dane, ele resmunga. E respira fundo, fechando os olhos. Esfrega outra vez o rosto. Com força. Sente um arrepio. Aquele pensamento. Aquela ideia. Às vezes, sente que é observado. Não quando está lá fora, obviamente. Sempre é observado quando está lá fora. O tempo todo. Não. A ideia surge quando está sozinho. Em casa, ou num quarto de hotel como esse. Uma câmera instalada no teto. No abajur. Em algum minúsculo buraco na parede. Quem me observa? Por quê? Dormindo. Acordando. Sentado na cama. Olhando para o chão, depois para os pés. Bocejando, esfregando o rosto. Respirando fundo. Ei, você aí. O que você ? Ele se levanta. Olha para um ponto qualquer no teto. Aquilo é um inseto? No sonho, alguém o sequestrava e metia dentro de um helicóptero. É o mesmo sonho que da outra vez? Não, não. Naquele, da semana anterior, na noite anterior ao jogo contra a Croácia, entrava num helicóptero por conta própria, embora tivesse a premonição de que o troço cairia. Morto num acidente. Por que entrava, então? Por que entrava, mesmo sabendo que morreria se o fizesse? Alguém o perseguia? Não se lembra. Acordou pouco antes da pane. Olhava para o chão lá embaixo, pensando: é isso, vai ser agora, vai cair, vou morrer. E então abriu os olhos e lá estava não o chão visto de uma grande altura, mas o teto do quarto de hotel. Feito esse. Sim, um inseto. Ele se move. Como se soubesse que está sendo observado. Talvez saiba. Lembra-se do sonho recente, do qual acordou pouco antes. Do sequestro. Não era um bandido, um jornalista ou sequer um torcedor. Sorri (ainda olhando para o teto, o inseto que se move): quem o sequestrava era El Patón. Armado com uma faca de caça. O helicóptero levantava voo. Por que faz isso comigo?, perguntava. Não se preocupe, Patón respondia aos berros, o helicóptero sobrevoando a orla de uma cidade desconhecida, as ondas quebrando lá embaixo, não se preocupe, Leo, é para o seu próprio bem. Como assim? Pra que essa faca? Patón sorria. Isso? Ah, relaxa. É tudo teatro. Ele, então, acreditando na palavra do outro, sentia-se protegido, guardado, seguro. E, de novo, como no outro sonho, olhava para a baixo. As ondas: o teto. Onde está? O inseto desapareceu. Basta um segundo de distração, pensa, voltando a se sentar na cama. Dois sonhos com helicópteros. A iminência de um acidente fatal. Depois, um sequestro. Logo El Patón? Que diabo. Respira fundo pela terceira vez. Precisa se apressar. Que horas são? Masche. Ángel. Café-da-manhã. E o jogo, claro. Mais um. Talvez o último. Sorri. Não. Sempre haverá outro. Sempre? Não, não, não. Por mais algum tempo. E (também pensa) mais alguns minutos cairiam bem. Agora. O celular sobre o criado-mudo. Meia hora, quarenta minutos. Estende o braço, clica na tela. Que diabo. Não os tem. Aqueles minutos, aquela meia hora. Não, não os tem. Precisa se apressar. Olha para o teto uma última vez. Observar, ser observado. O que você vê? É tudo teatro. Procura, procura. No momento em que vê de novo o inseto, alguém bate delicadamente à porta. Ele se move. Duas leves batidas. Ele ainda se move. Uma, duas. Para onde vai?

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E o Egito não é mais

Por André de Leones.

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Até logo, Mo!

Até algumas semanas atrás, dadas as péssimas atuações da seleção russa e a fase exuberante de Mohamed Salah, eu palpitava que os classificados do Grupo A seriam Uruguai e Egito. Então veio a final da Champions, a lesão de Salah, as dúvidas sobre sua participação no Mundial, depois ele sendo poupado no jogo de estreia, o gol uruguaio nos estertores daquela partida e, a partir daí, a débâcle se desenhando até culminar na derrota por 2×1 para a Arábia Saudita, de virada, agora há pouco. Foi uma jornada melancólica essa dos egípcios.

E não existe isso de jogo que “não vale nada” em Copa do Mundo, sobretudo entre seleções desse nível. Há sempre algo importante a se buscar. A primeira vitória, os primeiros pontos, algum consolo após duas rodadas devastadoras, uma despedida digna etc. Nesse sentido, o fato de que o gol da vitória surgiu da insistência (e de uma bela jogada desde a ponta direita), isto é, do esforço e não graças ao apito nervoso de Wilmar Roldán, no derradeiro lance da partida, é algo que certamente confere ainda mais graça à coisa.

Voltando a Salah, ele ainda capengava no segundo jogo (contra a Rússia), mas hoje parecia melhor; movimentava-se conforme o esperado, pelo menos. Fez um belo gol, teve chance para meter outro, deu passes sob medida para Trezeguet (que os desperdiçou e desperdiçou e desperdiçou — nada de novo, portanto). É certo que os dois (não-)pênaltis marcados pelo péssimo árbitro colombiano (dos quais só um foi convertido: El Hadary, 45 aninhos, defendeu o primeiro deles) não ajudaram muito o moral dos egípcios, mas a verdade é que os sauditas tiveram mais presença e organização para buscar o resultado.

E os egípcios, bem, há escolhas que independem da qualidade técnica dos jogadores. Em seu melhor momento na partida, em meados do segundo tempo, o Egito trocou passes curtos e procurou pressionar os sauditas com um mínimo de tato ofensivo, por assim dizer; nos piores, os atletas lançavam bolas para ninguém (ou para colegas sob forte marcação), telegrafavam passes como se a única transição possível fosse dos adversários (da defesa para o contra-ataque), bloquearam jogadas dos próprios companheiros e, de certo modo, pediram por aquele golzinho nos acréscimos.

Um exemplo: Salah recebe a bola na direita, faz o pivô, toca para Elneny e parte para dentro da área, a fim de recebê-la em condições de finalizar; em vez de completar a tabela (que, dada a posição dos defensores sauditas, era bastante promissora), Elneny tenta um chute grotesco, livrando-se da pelota como se estivesse no Emirates e o companheiro dentro da área fosse Welbeck, não Salah.

Não há desculpas para erros desse tipo, para escolhas um tanto amadoras, tornadas piores por se tratar de um atleta que, mal ou bem, disputa a Premier League. E são escolhas assim que explicitam o quão obscura foi a passagem egípcia pela Rússia, um misto de azar, displicência e incompetência.

 

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Uma boa pelada, convenhamos, não faz mal a ninguém

por Fernando Jasper

Não me entendam mal. Mas a Copa estava precisando de umas boas peladas, daquelas bem sem-vergonha, que se vê com volúpia e deixam saudade. E fomos redimidos, quem diria, por Suíça, Sérvia, Bélgica e Tunísia.

É claro que nada substitui o jogo bem jogado. Times que sabem tratar a bola, que jogam o fino pensando no gol mas sem fazer bobagem na zaga. Que avançam sem afobação, mas também sem driblar para trás nem tocar de lado.

Também têm seu valor os pequenos que, contra os bambambãs, se portam com dignidade, dão trabalho e passam o recado: quer passar de fase, topetinho, vai ter que rebolar.

O problema é que os campos da Rússia estavam ficando saturados de versões fraudulentas disso aí. Pretensos timaços impotentes contra timinhos retrancados. E timinhos nojentos incapazes de puxar um contra-ataque sem tropeçar na bola ou adiantá-la demais.

Daí a profusão de um-a-zeros e placares afins que nos põem para baixo e trazem à memória medos antigos (não, a Copa de 90 de novo, não) e pensamentos ruins (vou trabalhar que ganho mais).

Mas de repente me aparecem uma Sérvia e uma Suíça com uma surpreendente disposição para vencer, se atirando ao ataque sem medo de ser feliz, pensando mais em fazer (ainda que com alguma afobação) que em não levar (deixando expostas defesas que já não passavam grande segurança).

Bom é ser Shaqiri nessa vida, fazer o da vitória quando o sol já está caindo e beber uma gelada em seguida.

Um jogo lá e cá, cheio de alternativas, em que tudo pode acontecer e não dá para ir ao banheiro senão sai gol – e alguém me pare porque vou continuar enfileirando chavões. Que beleza o chute de Xhaka no empate suíço, sujeito na entrada da área que vê a bola rolando em sua direção, presente do zagueiro, e faz o que todos nessa situação deveriam fazer sob pena de expulsão: mete o pé, caramba!

Quer coisa mais pelada que o gol da virada? Fim de jogo, pessoal cansadão de lado a lado, alguém lá atrás vê um vazio e lança pro piazão que têm mais fôlego (vai, guri!), e este corre, corre, protege do zagueiro e chuta na saída do goleiro. Bom é ser Shaqiri nessa vida, fazer o da vitória quando o sol já está caindo (quem fizer ganha, alguém tinha gritado) e depois merecer cada gole da gelada que vão te pagar no boteco atrás do gol.

(O que estragou um pouco a diversão foi que nem o juizão de campo nem o de vídeo quiseram perder tempo com a dança do maxixe na área suíça, um sérvio no meio com dois zagueiros fazendo sanduíche. Numa pelada clássica não haveria juiz, o sérvio pediria a falta e assim seria. Fiasco grotesco da arbitragem padrão Fifa.)

Depois de um jogo desses, só poderia vir coisa boa. E veio. O placar de Bélgica e Tunísia fala por si, um 5 a 2 que melhora qualquer fim de semana. Se Sérvia e Suíça fizeram um embate entre mais ou menos iguais, a partida que abriu o sábado foi o duelo entre um time muito superior e um adversário fraco mas valente.

Pelada boa tem Lukaku lá na frente, a bola cai nos pés dele e você sabe que dali sai gol.

Não pense a Bélgica que será campeã se defendendo desse jeito, mas as falhas de sua defesa acabaram contribuindo para o espetáculo. Hazard foi pura classe. Lukaku fez os seus, um sujeito curioso, grandalhão que sabe finalizar – você vê a bola chegando nele e sabe que dali sai gol. Batshuayi, que entrou na metade do segundo tempo, é bem o contrário, um clássico perdedor de gols, desse a natureza cuida, a cada bola limpa que cai em seus pés você lamenta e se pergunta de que jeito ele vai errar. Mas pelada é pelada, e até ele fez o seu.

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Você topa torcer por uma pessoa odiável para conquistar a Copa?

Vou propor uma linha de pensamento em seguida e ela precisa de uma frase forte para começar, um palavrão mesmo (me desculpem!): E se Neymar for um filho da puta? E se esse atleta que lidera a equipe brasileira for uma pessoa odiável, um sujeito que dobra as linhas da moral e da ética para atingir seus objetivos e, porque não dizer, os objetivos da Seleção Brasileira, os nossos objetivos. É aceitável que nós, como brasileiros, torçamos por ele, para o comportamento que ele tem em troca do título da Copa do Mundo?

Pensem só e experimentem (eu sei que é difícil) imaginar essa questão sem ligá-la ao nome e à pessoa de Neymar e a Copa do Mundo. Seria palatável torcer por alguém assim? Sim, não, depende? Para quem gosta de futebol a pergunta soa mais pesada. Ou talvez não, pois a ética e a moral não deveriam ser mutáveis fosse qual fosse o objetivo. E aqui me desculpe pois falta-me completamente a base em filosofia (que não a de botequim – ou mesmo essa) para elaborar os conceitos de moral e ética. Mas tentando abstrair: compactuamos ou não com um canalha que nos promete levar a um objetivo comum mesmo sabendo que ele é um pusilânime?

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Pensei nisso vendo o jogo em um ambiente com muita gente (conhecida e desconhecida) hoje cedo, lendo e ouvindo sobre o jogo na TV, internet e redes sociais. Me parece que nunca houve um líder de time brasileiro em Copa tão odiado (e odiável) quanto Neymar em 2018. Minha impressão é que todo mundo sabe que Neymar é um extraclasse, mas no momento a maioria das pessoas não gosta dele. E mais: acha que os atalhos que ele toma dentro e fora do campo são inaceitáveis.

 

O que disso tudo é apenas narrativa?

 

E agora eu gostaria incluir a ideia de narrativa, de como uma pessoa é explicada pela mídia, e de que forma suas ações são levadas ao grande público. Grande parte dos brasileiros parecem ter raiva de Neymar pois ele não joga limpo. Ele se joga, ele cai-cai, dribla longe do gol sem objetivo, simula, chora (ou finge que chora), xinga, é mais preocupado em ser celebridade do que atleta, em aparecer na mídia do que no campo. Não é isso? Estou esquecendo alguma coisa?

Mas tudo isso é narrativa, é o modo como os fatos (ou as ações) são apresentadas. Neymar é cai-cai ou foi treinado para se proteger de faltas violentas (a imagem das meias rasgadas é visualmente importante) e por isso poucas vezes se machucou na carreira? Ele cai para ter um benefício e tentar enganar o árbitro pois gosta ou acredita que ter essa vantagem faz parte do jogo e é uma ação normal no futebol? Aqui vai um parêntese: será que é? Só é permitido ganhar jogando totalmente limpo? Quando Nilton Santos fez um pênalti em 1962 e deu um passo para fora da área para ludibriar o árbitro (e conseguiu) a história fala mais em malandragem do que desonestidade. Sobre xingar, ele é um atleta que não sabe perder ou não aceita a derrota enquanto alguns companheiros preferem baixar a cabeça e entregar o resultado antes do apito final?

Mas talvez o problema seja que em Neymar essas características não são desmontáveis. Ele não é apenas uma delas, mas todas. E essa conjunção de atitudes, mesmo que explicáveis separadamente, não desce. Ou quem sabe, como falou o colega de Calado Lielson Zeni, o que o brasileiro espera de Neymar é que se ele seja tudo isso, que pelo menos nos leve às costas aos títulos, as vitórias memoráveis. Mas se nem isso ele entrega – e quem conseguem levar um time às costas no futebol atual? (Messi não parece conseguir) – a frustração vira ódio. E odiar uma pessoa odiável é ainda mais fácil.

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Os jardins abandonados

Por André de Leones.

Neymar

Oh, Deus! Como são gestos vãos, inúteis,
A meu ver, esses hábitos do mundo!
Que horror! São quais jardins abandonados
Em que só o que é mau na natureza
Brota e domina. Mas chegar a isto!

Hamlet, ato I, cena 2.

O que dizer desse apanhado de homens (pais de família?) infantilizados que giram inutilmente e se jogam e xingam e esperneiam? O que dizer de um ídolo tão pequeno, tão reles, tão mesquinho? O que dizer de um jogo mequetrefe em que, por alguns segundos, os erros cometidos (pela arbitragem) em confrontos contra Turquia (2002) e Croácia (2014) voltaram a aparecer? Roubado só é mais gostoso para quem se refestela na lama. Felizmente, não foi assim. Pelo menos isso.

Mas lá estava o capitão redivivo, aquele mesmo Thiago Silva acovardado de outrora, hoje compensando (sejamos justos) pela técnica o que já lhe faltou em controle emocional — mas até quando? Lá estava o pobre Willian, ceifando um ataque após o outro graças a uma falta de cuidado que, diante de uma seleção ofensivamente melhor, poderia ser fatal. Lá estava Casemiro, irreconhecível na maior parte do jogo. Lá estava Coutinho, procurando por um espaço que seus companheiros foram, na maior parte do tempo, incapazes de ajudá-lo a abrir, criar ou descobrir. Lá estava Gabriel Jesus, incapaz de flutuar para além da calçada que pintou anos atrás e abrir, criar ou descobrir espaços para a infiltração dos companheiros. E lá estava Neymar, minúsculo, gritalhão, desonesto, risível.

Mas, como adiantei acima, o juiz felizmente voltou atrás na marcação do penal que Neymar escandalosamente tentou cavar, o Brasil venceu a Costa Rica por 2×0 e tudo o que ouço são meus vizinhos gritando “chupa, Argentina!” de suas janelas, como se uma vitória “achada” contra uma equipe medíocre (se tanto) tivesse alguma coisa a ver com o vexame argentino perante uma seleção talentosa e bem organizada, a Croácia de Modrić & cia. Não tem, mas e daí? Que gritem. Faz bem. Anima, reanima. É catártico. Nos jardins abandonados em que vivemos, a única coisa que resta a alguns é gritar.

Mas vi Neymar (aparentemente) indo às lágrimas ao final do jogo, ajoelhado no meio do gramado, e pensei: não. Não compro o choro. Não compro o ídolo. Não compro a falta de postura, a carência de profissionalismo, a falsidade, as molecagens, o desrespeito para com o árbitro, os adversários, os companheiros e os torcedores. Mesmo que vença a Copa, esta ou a próxima, esta e a próxima, Neymar ainda é e será um sintoma flagrante do que “brota e domina” por aqui, o produto moralmente falho de um não-país, a quintessência de uma geração de chorões e descompensados. Craque de futebol, é só. Tire o uniforme e as chuteiras e só restará um vácuo, a pura presentificação daquele abandono. Pobre demais. Paupérrimo.

Mas ainda há tempo. Não há? Sim, talvez haja.

É possível que, como aconteceu nas Olimpíadas (onde, se não me falha a memória, a seleção empatou os dois primeiros jogos), a equipe agora respire fundo, caia em si, reorganize-se tática e animicamente e deslize pela Copa afora com um mínimo de dignidade, ganhando ou perdendo. É bem possível que Thiago Silva siga aliando à sua inegável excelência técnica o controle emocional que se espera de um jogador profissional. É bem possível que Tite perceba que o lugar de Douglas Costa e Firmino não é o banco de reservas. E é possível até que Neymar cresça um pouco e se comporte como um adulto ou, pelo menos, como o ídolo dessa multidão tão maltratada — o máximo que, a essa baixeza das coisas, podemos esperar.

Torço por essas coisas e outras mais. Realmente torço. Mas as interrogações são devastadoras. Os vacilos, as desconfianças. “Cada fato sugere um mal latente”, diria Gertrudes. E, muitas vezes, nem latente é. Está ali, na nossa cara. Diante dos nossos olhos incrédulos. Que eles tenham algum descanso, afinal. Nossos olhos e ouvidos. Porque a alma brasileira queima a fogo brando, no espaço vazio, abandonado, desse jardim em que bem pouca coisa viceja.

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A histeria da imprensa

Na véspera da estreia, Marcelo Barreto lançou a seguinte pergunta no Seleção Sportv: o Brasil de Tite tem algum ponto fraco? Na bancada, salvo engano, os ex-jogadores Ricardinho, Deco e Petkovic. A pergunta ficou planando sem resposta por alguns segundos. Como o silêncio na televisão é um troço insuportável, Pet pegou a palavra. Mas quem esperava que ele fizesse alguma objeção, frustrou-se. Seu comentário foi mais uma laudação ao time de Tite, que, como todos sabiam e concordavam, estava pronto. Barreto (ou Rizek, o co-apresentador do programa) ficou satisfeito e o assunto estava terminado. Algo como: eu tentei, mas o time do Brasil de 18 não tem nenhum ponto fraco mesmo.

A estreia foi aquilo que vimos e, afinal, o Brasil de Tite, como qualquer outra equipe desta Copa, ou de todas as Copas, tem, sim, pontos fracos. Que tal um goleiro que não sai da meta nos cruzamentos, um craque que está voltando de lesão e apela para o individualismo quando as coisas não funcionam, um lateral direito limitado e um banco que dá pouquíssima condição de mudança de padrão de jogo. E, claro, algo que qualquer brasileiro que assistiu as duas últimas Copas sabe: o Brasil não sabe reagir quando toma um gol (vide Holanda em 10 e Alemanha em 14).

Nos debates da noite pós jogo, a arbitragem, especialmente o caso VAR, roubaram a cena (o trocadilho é intencional) das discussões. Não é que as críticas ao jogo do Brasil não existiram, mas era como se grande parte dos jornalistas fossem os brasileiros em campo: não sabiam reagir ao 1 a 1. Fomos roubados, gritavam.

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No dia seguinte, segunda, de cabeça mais fria, começaram as críticas ao time. Só que daí muitos passaram a eleger dois vilões, exatamente as unanimidades do time anteriormente: Tite e Neymar. Sobre o técnico, as críticas as substituições óbvias e as escolhas para o banco. Já sobre Neymar, a porteira estava aberta e as críticas, que começaram no corte de cabelo e no cai-caísmo rotineiro, evoluíram para questões de personalidade, de ética, de família e o escambau. Na terça à noite, na ESPN Brasil, um jornalista que sinceramente não sei o nome, disse que Neymar não gosta de futebol, mas de ser celebridade. Com que base ele falou isso, eu não sei. É impossível um jogador chegar ao nível de Neymar se ele não gosta de jogar futebol. Como se para se tornar o craque que Neymar é, o caminho fosse apenas fruto de inspiração e toque divino, não trabalho de anos. Que ele gosta de ser celebridade é inegável, sinal dos tempos e outro papo, igualmente interessante, mas não o motivo da atuação aquém ao potencial.

Até sexta de manhã a histeria chegará a níveis estratosféricos e não duvido que Galvão Bueno faça um editorial na véspera do jogo no Jornal Nacional conclamando a nação a se unir e aos jogadores para honrarem a amarelinha.

Mas então, e aí bancarei a mãe Dinah, tudo mudará sexta-feira às 11h, pois o Brasil perfeito de Tite retornará das cinzas atropelando a fraquíssima Costa Rica. E no Seleção Sportv da noite, quando Barreto (ou Rizek) lançar novamente a pergunta, um silêncio sepulcral será a resposta.

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‘Amor fathi’

Por André de Leones.

Ainda olho com muita desconfiança para a seleção russa, mas é inegável que, após o erro (desculpem) fatídico de Fathi, o quinto gol contra dessa Copa, os anfitriões tiveram o cuidado de matar o jogo, praticamente garantindo a presença nas oitavas e o retorno dos egípcios para casa: Putin 3×1 General Sisi.

Salah finalmente jogou, mas tão baleado que dava pena. É certo que marcou o único gol do Egito, de pênalti, ofereceu dois belos passes para um Trezeguet que, óbvio, não é aquele, e criou uma boa chance ainda no primeiro tempo, mas, lento, não conseguiu se desvencilhar da forte marcação e parecia se resguardar aqui e ali, como se temesse um contato mais assertivo por parte dos adversários.

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Qual Trezeguet é melhor? Esse aí da foto ou o egípcio? Só o tempo dirá.

Claro, é interessante que a seleção anfitriã marque presença no mata-mata (coisa da qual eu duvidava mesmo após a goleada sobre o catadão saudita), e pode até ser que, empurrada pela torcida e animada com os resultados positivos, ela cause algum estrago memorável ou, no mínimo, CENAS LAMENTÁVEIS dignas do país-sede. Mas, por outro lado, foi deprimente ver Salah jogando mal e perceber que, não obstante a estreia (até certo ponto) promissora contra um apático Uruguai, o Egito se assemelha ao ombro de sua maior estrela: dolorido, meio torto e preso numa tipoia tática & técnica que lhe restringe os movimentos.

Em todo caso, a virtual desclassificação egípcia não foi vergonhosa como a derrota da Colômbia para o Japão. A atitude infantil de Sanchez (não se mete a mão na bola nos primeiros minutos de um jogo de estreia, estúpido) deixou os latino-americanos com dez em campo desde o começo da partida. Cuadrado, que hoje parecia um Özil sob efeito de metanfetamina (agia com velocidade, de tal modo que conseguia a proeza de errar mais vezes por minuto do que o esbugalhado alemão), foi corretamente substituído ainda no primeiro tempo. Chances surgiram, a Colômbia chegou ao empate com uma bela cobrança de falta de Quintero, a bola vadiando rasteira por sob a barreira, mas Osako aproveitou um escanteio para guardar, de cabeça, o gol da vitória japonesa.

(Salvo engano, não vi nenhum japonês usando coque samurai.) (Só dizendo.)

Quando soou o apito final e eu vi as caras embotadas dos sudacos, lembrei-me do insosso James Rodriguez (que hoje só deu o ar da graça na segunda etapa) sendo “consolado” pelo esdrúxulo David Luiz há quatro anos, quando o brasileiro nem sonhava que, dali a poucos dias, os números 7 e 1 seriam escritos com a pena da galhofa nos ANAIS da História do Futebol Tupiniquim. Ainda faltam dois jogos, e tudo pode acontecer num grupo que ainda conta com Senegal (2) e Polônia (1). A não ser (ÓBVIO) que o majestoso Sadio Mané entre no BEAST MODE. Nesse caso, meus amigos e minhas amigas, a matemática é clara: Rússia vs. Senegal na finalíssima. Pois, como disse um amigo meu, Sadio tem um plano.

P.S.: Espero que Mo esteja bem. Mandei um whats, mas ele visualizou e ainda não me respondeu.

P.S. 2: Amor fathi eu furtei DAQUI.

 

 

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