Quem ganhará a Copa? Alguns palpites e um pesadelo

por Fernando Jasper

“Criticar é fácil” (Margie Simpson)
“E divertido” (Homer Simpson)

Tive um pesadelo esta madrugada, horas depois de concluir o texto abaixo. Sonhei que tentava preencher na planilha do Google minhas apostas para as quartas-de-final da Copa, mas o palpite que eu escrevia ora era derrubado para a célula abaixo, ora deslocado com carga faltosa para a célula da esquerda ou então a da direita. Não consegui identificar o agressor.

A aposta era, digamos, dissertativa. Era preciso indicar não só o resultado, mas as circunstâncias. Mais perturbador é que eu tentava descrever, no bolão das quartas, um lance envolvendo James Rodríguez e sua Colômbia, que, você sabe, não passaram das oitavas.

Depois de acordar, não consegui retomar o sono. A cada pouco me vinha a frase enigmática do zagueiro Mina (e o verso teus cabelo é da hora): “Se vocês soubessem o que aconteceu nas oitavas-de-final da Copa do Mundo da Fifa Rússia 2018TM, ficariam enojados”.

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Dois dias sem Copa e a pessoa está assim. Imagine quatro. Anos. E meio (a Copa do Catar será em novembro e dezembro de 2022).

Pode ser coisa do antibiótico. Vou ler a bula.

Ah, sim. O texto.

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O histórico da Alemanha em território russo talvez devesse inspirar mais cautela. Mas uma seguradora entende de cautela, concorda? Uma grande seguradora entende muito. Uma das maiores do mundo, então, definitivamente sabe o que está fazendo.

Foi munida desse conhecimento todo que a alemã Allianz, às vésperas da Copa, se negou a vender apólices para varejistas de seu país que prometiam prêmios aos clientes caso a Alemanha faturasse o pentacampeonato.

Resumidamente, as lojas queriam contratar um seguro para o caso de a seleção alemã vencer e elas terem de presentear os consumidores. Mas, para a Allianz, era óbvio que a Alemanha venceria e, consequentemente, ela teria de bancar a farra. Então a seguradora, cautelosa que é, decidiu não vender apólice alguma. E deixou de faturar uma boa grana, pois, como sabemos agora, os alemães – mais uma vez – foram derrotados na Rússia.

Allianz, UBS e Commerzbank apostaram na Alemanha (de verde na foto acima)

“Claramente nossos dados estavam errados. Entretanto, antes do evento eu creio que qualquer um acreditava que a Alemanha era a favorita”, admitiu um executivo da empresa, conforme o relato da Dow Jones Newswires.

Note que primeiro ele fala em “nossos dados” (o que dá um caráter científico à coisa, e se tem alguém munido de dados, de probabilidades, de estatísticas, esse alguém é uma seguradora), mas depois acrescenta que “qualquer um acreditava” no favoritismo alemão. Sem querer, equiparou os robustos softwares da companhia à vaga intuição de quem arrisca vintão no bolão da firma.

(Dizem que alemão não é teimoso; teimoso é quem teima com um alemão. Então sigamos.)

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Teve mais gente graúda falando em “nossos dados”, “modelagens estatísticas” e afins para palpitar sobre a Copa.

Usando uma “medição objetiva” do nível de habilidade das equipes, o banco suíço UBS definiu como favoritas, pela ordem, as seleções de Alemanha, Brasil e Espanha.

O japonês Nomura aplicou a “teorias de portfólio” e “hipóteses de mercados eficientes” para apostar numa final entre França e Espanha, com Brasil caindo nas semifinais.

A França de Mbappé é a aposta do banco japonês Nomura

O alemão Commerzbank, processando os números e modelando os dados, deu 18% de chances para a Alemanha e 13% para o Brasil, seguidos por Espanha, Argentina, França e Inglaterra.

Sem muita firula, o holandês ING estimou o valor de mercado dos jogadores e concluiu que a Espanha, por ter o time mais valioso, ganharia a Copa.

A Espanha foi a escolhida do holandês ING

Mas a aposta que eu mais gosto é a do norte-americano Goldman Sachs. Por dois motivos:

1) A metodologia exemplar, que não ouso resumir:

“A equipe global de pesquisa macro do Goldman Sachs optou por usar algoritmos de inteligência artificial para conduzir sua análise. Nós fornecemos dados sobre as características da equipe, jogadores e desempenho recente em quatro tipos diferentes de modelos de aprendizado de máquina para analisar o número de gols marcados em cada partida. Os modelos então aprendem a relação entre essas características e os gols marcados, usando os placares de jogos da Copa do Mundo e da Eurocopa desde 2005. Percorrendo combinações alternativas de variáveis, temos uma noção de quais características são importantes para o sucesso e quais permanecem no banco. Em seguida, usamos o modelo para prever o número de gols marcados em cada encontro possível do torneio e usar a pontuação não arredondada para determinar o vencedor.”

2) A coerência.

É que, por mais dados que a valorosa equipe do Goldman enfie nos processadores, o resultado final é sempre o mesmo: vai dar Brasil. O banco apostou na nossa seleção em 2006, 2010 e 2014, e cravou canarinho de novo em 2018.

O Goldman Sachs é o mais coerente em suas previsões. A cada Copa e em qualquer cenário, o campeão é sempre o mesmo

Houve algumas mudanças no decorrer desta Copa. Antes do início, o Goldman apostava que o Brasil venceria a Alemanha na final pelo insuspeito placar de 1,7 a 1,4. Pouco antes do encerramento da primeira fase, sob o efeito da Coreia do Sul, modificou a final para Brasil x Inglaterra, com título verde e amarelo.

E agora, enquanto tomo o cuidado de checar as bobagens que vou publicar, descubro que o banco atualizou seu palpite de final para Brasil x Croácia, também com vitória brasileira. Os croatas, segundo os magos das finanças, vão derrotar a Inglaterra na semifinal. A atualização data de terça-feira, dia 2, véspera da vitória inglesa sobre a Colômbia.

Notas

1. A título de referência, o Goldman Sachs é um dos protagonistas da crise financeira que estourou há dez anos. É um daqueles bancos que empacotaram e reempacotaram à exaustão créditos imobiliários podres e só não implodiram o mundo porque foram socorridos por bilhões de dólares dos cofres públicos – e hoje estão mais vivos que nunca. Envolvidos na mesma ciranda, UBS, ING e Commerzbank também foram salvos pelos contribuintes. O Nomura, por sua vez, aproveitou aquela crise para comprar fatias de bancos norte-americanos à beira da falência.

2. Caso você tenha chegado até aqui e, pior, esteja à espera dos meus palpites, aí vão. Em um bolão, no qual indiquei – antes do início da Copa – os quatro primeiros colocados, apostei em França, Argentina, Brasil e Alemanha, nessa ordem. No outro, com apostas concluídas após o fim da primeira fase, fui de Brasil, Espanha, Uruguai e Inglaterra. Ria à vontade. Mas tenho a consciência tranquila: nenhum animal, computador, modelo matemático ou Neymar foi ferido na produção desses palpites.

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